Motoristas calculam o lucro líquido, isto é, o valor que de fato entra no bolso depois de todos os gastos; é essa conta que define até qual corrida aceitar

Com o “aumento no número de motoristas de aplicativo em Campo Grande“, entender quanto realmente “sobra” no fim do mês virou uma conta cada vez mais complexa. É que a renda dos motoristas parceiros de empresas como Uber e 99, além de outros apps, não depende somente do valor arrecadado com as corridas feitas.

Entre esses fatores, entram desde a despesas com combustível, passando pela manutenção do automóvel (algumas vezes, aluguel do veículo ou prestação de financiamento) e estratégias de economia.

De forma geral, é assim que os motoristas calculam o lucro líquido, isto é, o valor que de fato entra no bolso depois de todos os gastos e investimentos. É essa conta que define se vale a pena continuar rodando, quantas horas trabalhar por dia e até que tipo de corrida aceitar.

Lucro líquido =

  • Receita bruta;
  • Taxa da plataforma;
  • Gastos variáveis (combustível; limpeza);
  • Custos fixos (manutenção; IPVA; seguro).

Estratégias

Com oito anos de experiência como motorista de aplicativo, Adriano Lopes Fernandes já realizou mais de 14 mil viagens só pela Uber. Para ele, entender o próprio rendimento exige mais do que olhar o valor que cai na conta ao fim do dia, é preciso estudar o comportamento da cidade, conhecer o automóvel e acompanhar o preço do combustível quase em tempo real.

“Primeiramente, tem que conhecer a plataforma em que trabalha – por exemplo, a Uber – e usar as informações que ela disponibiliza”, explica. “O motorista precisa saber os horários que têm mais corridas e as regiões com maior movimento. E também ficar por dentro do que acontece na cidade, como shows, provas, eventos, porque isso muda completamente a rotina de corridas”, acrescenta.

Adriano conta que o combustível é o principal gasto, representando cerca de 25% das despesas mensais, o que pode variar entre R$ 3 mil e R$ 5 mil dependendo do ritmo de trabalho. Já os custos com manutenção do veículo ficam entre 10% e 20% do total.

Sua rotina é baseada em metas de pontuação. “Minha meta de rodar é nos horários em que a plataforma me dá mais pontos. Fora desse horário, cada corrida é um ponto; mas, no horário de pico, são dois pontos”, explica Adriano.

O motorista conta ainda que busca cumprir um mínimo de 6 horas por dia — caso não consiga cumprir a meta, o tempo deve ser compensado no próximo dia.

Lucros e cálculos

Já para Yuri Rodrigues, que tem sete anos de experiência, o objetivo é tirar R$ 200 por dia, ou seja, R$ 100 livres nos dois turnos trabalhados. A meta de valor já é pensada de forma estratégica, visando aos lucros e contando com as despesas.

"No papel, seriam R$ 1.400 por semana ou R$ 6.000 por mês [...]. Desses R$ 200 diários, ainda preciso tirar o custo de: manutenção do carro, seguro, impostos, reserva para imprevistos. No fim do mês, o que realmente 'sobra' e vai para o meu bolso é muito menos."

Yuri relata que, atualmente, o que mais gera lucro são as corridas ofertadas com preço dinâmico, isto é, quando tem muita demanda e poucos motoristas na região. Porém, explica que não depende somente desse pico, pelo fato de o valor “final não chegar a R$ 2 por km”, afirma.

Para o motorista que inicia a jornada às 6h, o tempo de trabalho varia cotidianamente. Segundo Yuri, a ideia é atingir o lucro diário de R$ 200 livres ou trabalhar até as 19h, no máximo. O modelo de trabalho adotado pelo motorista é uma forma de não se desgastar tanto e ter tempo de lazer com a família.

"O momento de desligar o aplicativo é quando a taxa de exploração se torna insustentável. É quando o custo do meu tempo, o desgaste do meu veículo e o risco pessoal superam o valor pago", conclui Yuri.

Matemática

Yuri Rodrigues conta que a margem de lucro é o fator mais crítico. Segundo o motorista, mesmo que os valores ofertados nas corridas estejam abaixo do ideal, o ‘modo dinâmico’ é o que se torna o mais viável diante da necessidade. Sua regra para aceitar uma corrida é clara e imediata: corrida por menos de R$ 2 reais o km não compensa.

“Abaixo disso, o lucro é praticamente nulo, porque o valor não cobre o deslocamento até o passageiro, o trajeto final e o combustível”, afirma.

Ele explica que as plataformas penalizam as corridas mais longas, onde pagam menos por km. “Para você ver a contradição: uma corrida de 3 km paga entre R$ 5,50 e R$ 10. Já uma de 14 km paga apenas R$ 20 a R$ 24. A conta não fecha”, afirma.

Segundo Yuri, é como se a plataforma criasse um método no qual quanto maior for a distância das corridas, menor o valor pago aos motoristas. Para o motorista, o problema está na transparência da equação. Ele explica que a plataforma não informa o valor total da corrida pago pelo cliente, antes de aceitar a corrida. Essa brecha na transparência dificulta na hora de escolher ou não uma corrida.

"Numa corrida de R$ 8, a plataforma fica com R$ 1. Numa corrida de R$ 100, pode ficar com R$ 40. Eles não cobram menos do cliente na longa distância. Eles apenas aumentam sua participação no ganho do motorista", explica Yuri.

Para esclarecer melhor, o motorista explica que, em uma corrida de R$ 20, paga pelo cliente, ao menos R$ 8 ficam com o aplicativo.

Já para Adriano Lopes, a estratégia adotada para avaliar o lucro em cada corrida é usando as informações do próprio aplicativo. Segundo Lopes, a plataforma Uber disponibiliza informações sobre como está a demanda no turno de cada motorista, uma tática que pode influenciar no tempo de deslocamentos e lucros.

Adriano conta que começou como motorista de aplicativo para ter renda extra, mas que hoje é sua única fonte de dinheiro. O motorista também trabalha com corridas particulares, além do aplicativo.

Yuri explica que a relação com o aplicativo é frustrante e injusta. Conforme o relato, a categoria precisa lidar com os riscos da função e não tem controle direto do próprio lucro. “Assumimos todos os riscos da função, e uma parte significativa do nosso ganho é tomada pela empresa sem um acordo real e sem que tenhamos opção”, conclui.

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