Atuação e possível negligência do Conselho Tutelar já virou alvo de questionamentos em anos anteriores diante da morte de outras crianças, como Sophia e ‘Estrelinha’

A Câmara de Vereadores de Campo Grande pode propor uma conversa com o Conselho Tutelar para apurar o fluxo de atendimento após a morte brutal da menina Emanuelly Victória Souza Moura, conhecida como Manu, na última quarta-feira (27). A garota de 6 anos foi sequestrada, morte e estuprada por Marcos Wilian Teixeira Timóteo, de 20 anos, que morreu em confronto com a polícia na última quinta-feira (28).
A atuação e possível negligência do Conselho Tutelar de Campo Grande já virou alvo de questionamentos em anos anteriores, diante da morte de crianças como Sophia Ocampo, e de Isadora Araújo Martins (a ‘Estrelinha’).
A família de Emanuelly era acompanhada pelo Conselho Tutelar desde 2020, após alerta de maus-tratos. Depois da morte da menina, o MPMS (Ministério Público do Estado de Mato Grosso do Sul) instaurou um procedimento para apurar se houve omissão na atuação do Conselho Tutelar Sul. O procedimento tramita em caráter sigiloso e encontra-se em fase de investigação.
De acordo com o vereador Landmark Rios (PT), há a intenção de chamar os conselheiros tutelares para comparecem na Casa de Leis.
“Acho que houve omissão da escuta. A escuta não funcionou, seja do conselho tutelar, ou da família, ou da mãe, ou dos vizinhos […] nós vamos estar propondo, dentro em breve, uma conversa com esses conselheiros, entender esse fluxo, como que está isso, como que existe”, afirmou o vereador.
Audiência pública
A tragédia com Emanuelly comoveu Campo Grande, levando a população e políticos a cobrarem penas mais altas em crimes bárbaros. A competência para definir penas e período de reclusão é do Congresso Nacional, mas políticos regionais podem atuar e propor políticas públicas que reforcem a rede de proteção.
A vereadora e presidente da Comissão Permanente de Políticas e Direitos das Mulheres, de Cidadania e Direitos Humanos, Luiza Ribeiro (PT), reforça que a segurança de crianças e adolescentes envolve também a permanência na escola.
Uma audiência pública sobre a falta de vagas na educação infantil será realizada na Câmara de Vereadores, na próxima segunda-feira (1º). Atualmente, são 5.638 crianças na fila de espera por uma vaga na Capital.
“Como faz para garantir a segurança para as crianças? É ter um ambiente adequado para o seu desenvolvimento. E aonde as crianças têm que estar? Na escola. Então, nós precisamos para as crianças de 0 a 3 anos vaga para todas elas na educação infantil”, protesta.
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A vereadora também cobra mudança no comportamento machista de homens que acreditam que a vida e dignidade de crianças e mulheres é insignificante. “Ninguém aguenta mais tanta violência. Não podemos esquecer que quem é o violento são homens. Quem faz violência sexual contra criança, quem mata mulheres, quem mata crianças, são homens, e eles não podem fugir desta responsabilidade”, critica.
Já o presidente da Comissão Permanente de Proteção dos Direitos da Criança e do Adolescente, vereador Herculano Borges (Republicanos), estuda a apresentação de um projeto que visa coibir violência.
“O Brasil precisa de uma legislação muito mais severa em crimes hediondos desta natureza. Esse bandido deveria estar preso, pois possui passagens anteriores por furto qualificado, dois estupros de estupro de vulnerável, além de violência doméstica. É inadmissível que um sujeito que já cometeu tanto crime bárbaro como esses estivesse em liberdade”, lamentou.
Marcos Wilian Teixeira Timóteo, assassino de Emanuelly, estuprou um bebê de um ano de idade quando tinha 14 anos. Contudo, o abuso foi ato infracional devido à inimputabilidade por ser menor de idade.
Assassinato
Emanuelly foi encontrada morta numa banheira, embaixo de uma cama, dentro da residência de Marcos Willian, localizada na Rua Joaquim Manoel de Carvalho, na Vila Carvalho, em Campo Grande.
Quando os policiais chegaram à casa do suspeito, encontraram a residência vazia. O chão da cozinha estava sujo de barro e com marcas de chinelo. Com isso, eles entraram na casa e fizeram uma varredura.
Em um dos cômodos, os policiais ergueram uma cama e, embaixo, estava uma banheira de bebê contendo, em seu interior, um volume grande enrolado em uma coberta marrom, presa com fita adesiva. Ao abrirem parcialmente a coberta, Emanuelly foi encontrada morta.

Braço quebrado
O último atendimento do Conselho à família foi em maio, quando uma das agressões resultou em um braço quebrado de Emanuelly. A menina não era alimentada adequadamente, segundo consta no documento.
Devido às agressões sofridas, Emanuelly também deixava de frequentar a escola. Quando recebeu atendimento, o padrasto afirmou que as denúncias eram por desentendimentos familiares e que a renda da família é limitada ao Bolsa Família.
Na época, foi relatado que, mesmo com dificuldades, o básico para as crianças estava sendo garantido. Equipes do Cras (Centro de Referência de Assistência Social) Guanandi acompanhavam a família, mas, na época do atendimento, não foram identificados indícios de violação de direitos das crianças nem de violência sexual, apenas situação de vulnerabilidade social.
MPMS abre investigação
O MPMS (Ministério Público do Estado de Mato Grosso do Sul) instaurou um procedimento para apurar a atuação do Conselho Tutelar Sul, após a morte da menina Emanuelly Victória Souza Moura.
O procedimento é para verificar se houve omissão no cumprimento das atribuições legais do órgão, como também averiguar se essa omissão teria relação com o desfecho da morte da criança.
No entanto, o procedimento tramita em caráter sigiloso e encontra-se em fase de investigação.
O que diz o Conselho Tutelar Sul?
“O Conselho Tutelar da Região Sul manifesta profundo pesar pelo falecimento de Emanuelly Victoria Souza Moura e se solidariza com seus familiares e amigos neste momento de dor.O ocorrido na última quarta-feira, que ceifou de forma trágica a vida de Emanuelly, trata-se de um crime hediondo, marcado por extrema crueldade, sem qualquer relação com a atuação deste órgão no atendimento à família ou com suposta omissão, como vem sendo sugerido.
Nos atendimentos prestados, não foram identificados elementos que justificassem a medida de acolhimento institucional, conforme estabelece a Portaria nº 01/2025, expedida pela Vara da Infância e Juventude, e o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). Ademais, diante de denúncias recebidas, Emanuelly passou por depoimento especial, ocasião em que a criança não relatou nenhuma violação de direitos.
O Conselho Tutelar coloca-se à disposição das autoridades competentes para prestar os devidos esclarecimentos sobre os atendimentos realizados. Contudo, em respeito à família e em observância à legislação, não serão fornecidas informações adicionais, devido à lei de proteção de dados.
Repudiamos qualquer tentativa de explorar o ocorrido para promover ataques, gerar desordem social ou criar tensão desnecessária em relação ao Conselho Tutelar, assim como utilizá-lo para fins de promoção pessoal. Reforçamos que a garantia de direitos é dever da família, da sociedade e do poder público, não sendo atribuição exclusiva de um único órgão da rede de proteção. Apenas com atuação conjunta e articulada será possível assegurar a proteção integral de crianças e adolescentes.
O episódio evidencia a importância do Cadastro Nacional de Pedófilos e Predadores sexuais, a fim de que a sociedade tenha instrumentos de controle sobre pessoas com histórico de crimes sexuais, considerando que, conforme reportagens divulgadas, o autor já havia respondido por fatos análogos ao estupro de vulnerável e outras violências.
À população, o Conselho Tutelar Sul reafirma o compromisso com a vida, a proteção integral e a justiça em favor de todas as crianças e adolescentes.”
