Sergio Massa, o candidato da coligação governista e atual ministro da Economia da Argentina, terminou na frente no primeiro turno das eleições do país neste domingo (22). Ele não era o favorito, e o resultado é considerado surpreendente.
Massa vai concorrer no segundo turno da disputa presidencial, marcado para 19 de novembro, com Javier Milei, candidato populista que se define como libertário e que, em agosto, havia vencido a votação das primárias.
A apuração dos votos deste domingo chegou a 98,51%. O resultado da votação dos dois candidatos mais bem colocados no primeiro turno foi:
- Sergio Massa, com 9,6 milhões de votos, ou 36,68% do total
- Javier Milei, com 7,8 milhões de votos, ou 29,98% do total
A apuração de votos ainda não terminou. Acompanhe na cobertura ao vivo a contagem dos votos.
Na Argentina as regras facilitam vitórias em primeiro turno. Desde que as regras eleitorais atuais foram implementadas, em 1994, só houve segundo turno duas vezes. Em uma delas, em 2003, um dos candidatos abandonou a corrida, e o outro foi eleito mesmo sem uma votação. Os argentinos só votaram em segundo turno em 2015.
Milei era o favorito para vencer o primeiro turno porque ele havia sido o vencedor das primárias, a votação em que as coligações políticas escolhem seus candidatos. A coligação de Massa havia ficado em terceiro nas primárias, atrás de Patricia Bullrich.
A votação deste domingo mostra que a corrente politica dos peronistas, à qual Massa pertence, ainda tem força (leia mais abaixo).
Eleitores de outros candidatos vão ser decisivos
Além dos dois finalistas, havia outros três candidatos na votação:
- Patricia Bullrich, candidata da direita tradicional, com 23,83%;
- Juan Schiaretti, um peronista do estado de Córdoba, com 6,78%;
- Myram Bregman, candidata trotskista de esquerda, com 2,70%
Os eleitores desses três outros candidatos vão ser decisivos para o resultado final dessas eleições presidenciais.
Patricia Bullrich já deu sinais de que não vai apoiar Sergio Massa. Ela fez um discurso para admitir que perdeu e evitou parabenizar o vencedor, além de ter afirmado que não pode saudar alguém que fez parte do “pior governo da Argentina”. Ela disse que, nos últimos tempos, o governo atual só distribuiu dinheiro e afundou o futuro do país.
Patricia Bullrich já deu sinais de que não vai apoiar Sergio Massa. Ela fez um discurso para admitir que perdeu e evitou parabenizar o vencedor, além de ter afirmado que não pode saudar alguém que fez parte do “pior governo da Argentina”. Ela disse que, nos últimos tempos, o governo atual só distribuiu dinheiro e afundou o futuro do país.
Massa e o kirchnerismo
Massa é um peronista, ou seja, ele é da corrente política herdeira do ex-presidente Juan Domingo Perón, que foi presidente da Argentina três vezes no século 20.
Nos últimos 20 anos, o peronismo é dominado por uma corrente de esquerda, o kirchnerismo – aliados de Néstor e Cristina Kirchner, que foram presidentes do país a partir de 2003.
Massa teve uma relação ora próxima ora distante com os Kirchner.
Ele foi ministro dos governos de Néstor e Cristina, mas rompeu com os aliados e tentou se estabelecer como um peronista não kirchnerista. Em 2015, ele se lançou como candidato de oposição ao governo de Cristina. Massa acabou perdendo para um outro opositor, Maurício Macri.
A reconciliação com o kirchnerismo veio em 2019. Os peronistas, em um sinal de união, lançaram Alberto Fernández como candidato a presidente, Cristina Kirchner como vice e Sergio Massa como o primeiro nome da lista de deputados federais (no país, não se vota em uma pessoa para deputado federal, mas em uma frente política, e a ordem dos políticos que vão ocupar os cargos é elaborada pelos próprios dirigentes).
Eleito, Massa foi escolhido para a presidência da Câmara dos Deputados. Ele tem reputação de ser um político pragmático e um bom negociador.
Em agosto de 2022, ele assumiu o Ministério da Economia. A inflação estava descontrolada, e o país estava com dificuldade para fazer pagamentos ao FMI. A situação da inflação não melhorou nos últimos meses.
Início de carreira em partido de direita
Filho de um imigrante italiano, Massa começou a vida política em um partido conservador, a UCeDé. Na época, o peronismo (corrente política ligada ao ex-presidente Juan Domingo Perón) vivia uma fase de direita.
A UCeDé era da base do governo, e Massa acabou migrando para o peronismo. Ele foi eleito deputado federal em 1999, e, pela primeira vez, ficou no Legislativo até ser nomeado para um cargo no governo federal –dessa vez, foi para o órgão responsável pelas aposentadorias na Argentina.
Depois de trabalhar por anos no governo federal, ele e Cristina Kirchner romperam. Pouco depois, ele foi eleito prefeito da cidade de Tigre, perto de Buenos Aires.
Em 2015, na primeira vez que se candidatou à presidência, ele atacou bastante os governistas –Cristina ainda era a chefe do governo.
O que esperar de um eventual governo de Massa
Massa já afirmou que quer implementar políticas para recuperar o poder aquisitivo das famílias. Ele também disse que prentende implementar distribuição gratuita de medicamentos, incluir novos direitos nas leis trabalhistas, reformar o sistema educacional e implementar políticas para reduzir as emissões de gases do efeito estufa e a poluição proveniente das indústrias de petróleo, gás e mineração. Além disso, Massa expressa a intenção de fortalecer as empresas estatais.
A maior dificuldade atualmente é a estabilização da economia. Como ministro da Economia, Massa enfrenta uma alta inflação, que atingiu 138% ao ano. Para enfrentar esse problema, ele diz que terá foco em fortalecer as exportações como uma fonte de entrada de divisas, o que, por sua vez, poderia ajudar o governo a estabilizar a moeda argentina, o peso.
Massa também planeja implementar cortes de gastos, incluindo a transformação de programas de assistência social em programas destinados a impulsionar o emprego formal. Ele quer, ainda, realizar uma reforma tributária para simplificar a arrecadação de impostos.
Javier Milei: o ultraliberal que surpreendeu
A motosserra que Milei leva aos comícios representa uma de suas principais propostas eleitorais: a redução do tamanho do Estado argentino. Ele afirma que pode alcançar uma diminuição equivalente a 15% do Produto Interno Bruto (PIB) do país.
Isso incluiria a redução do número de ministérios de 18 para 8, eliminando pastas como Cultura, Ciência e também Meio Ambiente – Milei é defensor da ideia de que o aquecimento global não é causado pela atividade humana.
Além disso, Milei expressou a intenção de retirar financiamento da Conicet, uma agência que financia pesquisas científicas na Argentina. Ele também pretende encerrar o Banco Central, embora seja notável que sua proposta de dolarização da economia não tenha sido detalhada em seu programa.
O candidato promete reformas no setor elétrico, uma abertura comercial radical e a privatização de empresas estatais como a YPF e a Aerolíneas Argentinas. Como católico praticante, Milei também é contrário à lei que descriminalizou o aborto no país e manifestou a intenção de tentar revertê-la. Ele quer, ainda, revogar algumas das leis sobre educação sexual no país.
O economista também afirma que vai dolarizar a economia, mas isso não consta em seu programa de governo.
Segundo Maria Esperanza Casullo, professora da Universidad Nacional de Río Negro, Milei fala da dolarização com uma ambiguidade estratégica, porque ele nunca se expressa claramente, e os assessores já deram sinais contrários ao plano.
“Ele nunca diz como essa dolarização aconteceria, qual seria o valor de referência ou os prazos da mudança, e esses sinais confusos permitem que a dolarização seja uma promessa, mas, ao mesmo tempo, se não ocorrer em um eventual governo dele, ele possa negar que tenha se comprometido com a dolarização”, diz ela.
O economista ainda quer criar um sistema de vouchers para a educação. Funcionaria assim: as escolas deixam de receber financiamento direto do Ministério da Educação. As famílias passam a receber um voucher para gastar na escola que escolherem.
Ele ainda quer reduzir a idade penal, liberar a venda de armas de fogo no país e proibir dificultar a entrada de estrangeiros.
Fonte: G1